Parentes do atirador de 16 anos no bairro Coqueiral, em Aracruz (ES), vivia em uma rua silenciosa, mas agora passou a ser monitorada por uma viatura da Polícia Militar. Antes do ataque a duas escolas da região, onde o adolescente matou quatro pessoas e feriu 12 na sexta-feira (25), porém, não havia medo ou sensação de insegurança por ali.
Na via, era comum presenciar o adolescente praticando corrida ou caminhada ao lado do pai, que atua como policial militar.
Mas a interação dele se restringia à família nos últimos anos. No celular apreendido pela polícia após o crime cometido com as duas armas do PM, só havia dois contatos, registrados como “pai” e “mãe”, disse o delegado André Jaretta, responsável pela investigação.
De acordo com vizinhos próximos da casa da família ouvidos pela reportagem, o adolescente costumava desviar o olhar se alguém o cumprimentava. Ou evitava contato visual usando óculos escuros.
Quando não estava com o pai, tinha o hábito de se exercitar em uma academia comunitária a aproximadamente 200 metros de casa ou de andar de moto pelas ruas da região, onde é mais comum ouvir o som dos pássaros do que o barulho de um carro.
Isolado
Durante a pandemia, ele passou a se isolar ainda mais, fazendo com que o pai passasse a forçar uma aproximação maior. Colegas de farda do PM dizem que ele começou a estudar psicanálise para ajudar nos cuidados com o filho, que já demonstrava alterações no comportamento desde a infância.
Isso teria motivado uma mudança drástica na rotina do próprio pai, que deixou de consumir bebidas alcoólicas até socialmente nos últimos anos para tentar ajudar o garoto.
Relação na escola
Mesmo que considerado um bom aluno, daqueles que sentam perto da professora e tiram notas altas, ele deixou a escola estadual Primo Bitti em junho deste ano a pedido dos pais, segundo a polícia. A instituição de ensino foi o alvo do seu primeiro atentado na última sexta.
O jovem invadiu a sala das professoras pela porta dos fundos para atirar. O palco do ataque era um ambiente que o atirador conhecia bem. Quando criança, ele acompanhava a mãe lá. Na época, ela era professora do colégio — hoje está aposentada.
Durante a infância
O autônomo Alexsandro Neumeg, 39, disse que o garoto até costumava jogar videogame ou brincar com o seu filho quando ainda era pequeno. Mas não ficava por muito tempo.
“Era um menino que a mãe e o pai sempre vigiavam. Falavam: ‘Ó, brinca aqui na rua onde eu possa estar vendo.’ Mas isso nunca tinha me chamado a atenção. Aqui, é como você está vendo. A vizinhança não interage muito.”
Um garoto da sua idade, que também mora perto dali, disse que jogava futebol com o atirador quando eles ainda eram crianças, em uma escolinha ligada a uma igreja evangélica da região.
O vizinho disse ter percebido a mudança de comportamento com o passar dos anos, quando eles eram colegas na escola. “Ele estava diferente. Não falava com ninguém.”
Ao contrário do pai, a mãe que participava ativamente de ações sociais e atuava como líder comunitário na região, a mãe era mais reservada. Quando ainda lecionava, não costumava se reunir com as outras professoras. A rotina dela era da casa para o trabalho.
“Rapaz… Eu moro aqui há dez anos e só conheci o pai dele em um evento comunitário na inauguração de uma academia popular. A mãe, eu nunca vi”, disse Marcelo Pedrini, 47, que olhava fixamente para a casa da família enquanto esperava pela chegada do ônibus que o levaria ao trabalho ontem.
Mudança de rotina
Após o crime, a rotina mudou por ali. Mesmo sem qualquer tipo de envolvimento com a família, os moradores também passaram a conviver com o medo de serem atingidos por algum ataque em represália ao atentado.
Os vizinhos ficaram, mas os pais do atirador não estão mais no imóvel de dois pisos. É possível ver iluminação pelas fendas da cortina que cobre a visão de uma das janelas, como se a luz de um dos cômodos permanecesse acesa. Deixaram para trás um cão, alimentado por parentes, e a sensação de tranquilidade, que até então era uma das principais características do local.
Fonte: UOL