Uma pesquisa do professor Tiago Pereira, do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da Universidade de São Paulo (USP), em São Carlos (SP), irá receber R$ 1 milhão para desenvolver uma teoria matemática capaz de descrever comportamentos em sistemas dinâmicos não-lineares, como o cérebro, as redes sociais e os sensores de cidades inteligentes. Os recursos são do Instituto Serrapilheira de fomento à ciência brasileira.
O objetivo é entender qual a regra usada pela natureza para dar ordem às coisas. “A ideia é encontrar uma equação que possa, ao ser analisada, dizer o que pode acontecer naquela rede, seja ela uma pessoa, um órgão ou uma cidade”, explicou.
De acordo com o pesquisador, o desafio está em entender redes complexas, com muita interação.
“Nós entendemos relativamente bem o que acontece quando um sistema está isolado. Por exemplo, sabemos o que um neurônio isolado faz. Mas na natureza as coisas interagem. Então, o comportamento de um elemento depende do que acontece em sua volta e o que esse elemento faz na rede é bastante diferente do que ele faz quando está isolado”, explica o pesquisador.
Segundo o pesquisador, o estudo tem potencial para ajudar a compreender sobre as transformações que ocorrem nas redes complexas e que levam, por exemplo, ao surgimento de doenças como a epilepsia ou para determinar um tratamento eficaz para problemas de saúde.
“Nosso sonho é, a partir de observações do sistema no estado saudável, prever quando e como essas transições indesejadas ocorrem. Assim, conseguiríamos desenvolver mecanismos de prevenção e tratamentos personalizados.”
“Você vai ao médico e toma um remédio que todo mundo toma. A nossa ideia é fazer o remédio funcionar para você. A gente coletaria todos os dados de como você está funcionando, descobriria as equações e, no computador, analisaria todos os possíveis cenários e descobriria o tratamento para você”, explicou.
Incentivo
A pesquisa de Pereira está entre as 12 selecionadas para receber financiamento do Instituto Serrapilheira, o primeiro do Brasil de incentivo à pesquisa.
Pereira participou de uma chamada de pesquisas no ano passado que recebeu mais de duas mil propostas e ficou entre as 60 que foram selecionadas. As pesquisas foram inscritas de forma anônima, os projetos não tinham nomes dos pesquisadores e foram avaliados por um comitê estrangeiro.
Os estudos selecionados receberam R$ 100 mil e foram acompanhadas por um ano por um comitê de pesquisadores brasileiros e estrangeiros. Ao final deste tempo, 12 foram selecionados para receber R$ 1 milhão.
Os recursos deverão ser usados em três anos e têm também um caráter inclusivo: R$ 700 mil são concedidos de forma incondicional e R$ 300 mil estão condicionados à integração e formação de pesquisadores de grupos sub-representados ou minorias na ciência.
“Nosso objetivo é identificar os talentos que acabaram de entrar no sistema acadêmico e, em longo prazo, criar uma rede de futuros líderes da ciência brasileira”, disse o diretor-presidente do Serrapilheira, Hugo Aguilaniu, no anúncio dos contemplados, que ocorreu em 17 de maio.
O financiamento recebido pela pesquisa de Pereira será usado para montar uma equipe treinada e especializada e fazer interação com pesquisadores estrangeiros, com intercâmbios de conhecimentos.
“Esse recurso é importante porque nesse projeto a gente não sabe o que vai acontecer e é de longo prazo, seria difícil para as agências de fomento financiarem.”
Para Pereira, receber esse aporte de recursos no atual cenário de cortes nos investimentos em educação, ciência e tecnologia no Brasil é extremamente relevante.
“É muito triste ver uma ação orquestrada contra educação, justamente num país em que a gente precisa tanto disso. Meus pais estudaram apenas até o quarto ano do ensino fundamental. No meu caso, realmente, ler um pouco mudou a minha vida”, disse.