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sexta-feira, 17 maio, 2024

O desmonte da pesquisa agrícola

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A capa da edição da Folha de S. Paulo de 19/2 faz chamada para a discussão sobre a fabricação de notícias falsas e, virando a página, depara-se com o artigo do Governador Geraldo Alckmin “Os desafios do agronegócio” no espaço Tendências/Debates. Uma inusitada combinação como presente para os leitores da Folha neste aniversário de 96 anos.
O Governador justifica a valorização do agronegócio em São Paulo, enaltecendo a rede pública de ensino técnico, tecnólogo e universitário no fornecimento de mão de obra qualificada. Porém, tentou retirar 10% do orçamento de 2017 da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – Fapesp –, que financia as atividades de pesquisa nessas instituições. O ato foi inconstitucional, criticado pela comunidade científica e até por representantes tucanos da direção da Fundação. Houve mudança de postura, um certo recuo, mas a solução apresentada ainda é um atentado à autonomia da Fapesp, ao se vincular parte dos recursos para substituir verba de infraestrutura que deveria ser provida pela administração direta, não pela Fundação. Talvez em função do meio político e palaciano em que vive, queira impingir aos pesquisadores paulistas a suposição de serem incompetentes para lidar com recursos públicos de forma autônoma com a devida lisura.
No tocante à logística, a prática é o governo arcar com todos os custos de recuperação das rodovias e depois presentear a iniciativa privada com as concessões. Assim foi feito, por exemplo, com a Rodovia D.Pedro I, que liga Campinas ao Vale do Paraíba: era administrada pela Dersa, com cobrança de dois pedágios e, depois da concessão, passou a ter três pedágios com aumento imediato no valor total cobrado de cerca de 30%. Em uma frase de efeito, Alckmin consegue transformar a repetição dessa prática, em função da longeva permanência à frente do governo, em “experiência”.
Causa também estranheza terem sido mencionados os programas de conservação de recursos hídricos e afins, pois foi publicado no dia 16/1/2017 o chamamento público da Secretaria do Meio Ambiente 1/2017/GS para a cessão e venda de áreas ambientais para a iniciativa privada, como é o caso do Horto de Tupi em Piracicaba. A importância da manutenção do Horto como área pública levou a população impactada a forte mobilização e protestos.
O mais surpreendente é o Governador discorrer sobre a rede paulista de pesquisas agrícolas, haja vista o explícito desmonte dos Institutos do Estado. O Instituto Agronômico de Campinas – para se limitar a um exemplo – sofre com a falta de contratação de pesquisadores e de pessoal de apoio há muitos anos, coincidentes com o período da “experiência” mencionado pelo Governador. A forte redução e até a extinção de recursos para as linhas de pesquisa levaram a interrupções de projetos e forçaram que especialistas tenham de dedicar boa parte do seu tempo em atividades de apoio por falta de pessoal. Assim, se consuma a precarização que leva ao sucateamento da Instituição, que é um passo para a sua privatização. A pesquisa agrícola é a mais afetada pela Lei 16.338 de 14/12/2016, que autorizou o governo a vender áreas de Institutos de Pesquisa destinadas aos experimentos de campo, que demandam espaço e tempo para se chegar ao desenvolvimento das variedades mencionadas pelo Governador, que desconhece esse processo de construção do conhecimento e da tecnologia.
A pujança paulista na área agrícola é função da dedicação dos habitantes do estado em todas as áreas envolvidas (pesquisa, ambiental, logística), mas que sofre forte ameaça no atual governo, talvez não explicitada, porém vivenciada.
Adilson Roberto Gonçalves, doutor pela Unicamp, Livre-Docente pela USP, é pesquisador da Unesp de Rio Claro.

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