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sexta-feira, 18 outubro, 2024

“Atuação policial contra negros chegou ao limite”

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Desde junho passado, o reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares, José Vicente, lidera o Movimento AR, movimento que procura voluntariamente “mudanças e transformações sociais por meio de ações efetivas de combate ao racismo, preconceito e discriminação racial contra negros”. No grupo estão intelectuais e formadores de opinião, como Cláudia Costin, especialista em Educação, Luiz Carlos Bresser Pereira, economista e ex-ministro da Fazenda e a empresária Luiza Trajano.

José Vicente escreveu um manifesto com críticas à atuação policial e de empresas privadas de segurança contra jovens negros e moradores de periferia. “Chegamos ao limite do que nos separa da irracionalidade”, afirmou ele sobre operações em que policiais foram flagrados agredindo pessoas negras já sob custódia. “Como indivíduos e sociedade, não tem outra ação ou postura que não seja a de dizer um basta. É indispensável que nos juntemos para dar um salto civilizatório contra esse tipo de prática que remonta a tempos do primitivismo”, afirmou em entrevista à BBC News Brasil.

José Vicente nasceu em Marília, interior paulista, e trabalhou até como bóia-fria antes de se formar em Direito. É um dos fundadores da Zumbi dos Palmares, criada em 2004 como a primeira (e até agora única) faculdade negra do Brasil. Com sede em São Paulo e 1.500 estudantes – 80% deles negros – a faculdade mantem cursos de Direito, Comunicação e Administração.

Em sua entrevista à BBC Brasil, Vicente falou sobre o que tem feito em reuniões e encontros com autoridades para discutir a violência policial contra negros. “Digo que chegamos ao nosso limite civilizatório. Ou temos a capacidade de nos rebelar contra esse destino manifesto ou não teremos um legado para os que virão: não vamos olhar para as futuras gerações sem nos sentirmos como um bando de incompetentes e covardes. Como indivíduos e sociedade, não tem outra ação ou postura que não seja a de dizer um basta. É indispensável que nos juntemos para dar um salto civilizatório contra esse tipo de prática que remonta a tempos do primitivismo social e político.

A polícia está pisando no pescoço de uma mulher, mãe e avó, na frente dos seus filhos e netos, de uma maneira injustificada, desnecessária, opressiva e criminosa. E ninguém está levantando contra isso: nem a corporação, nem o Estado nem as pessoas que são mais aguerridas na defesa de dignidade humana. Ninguém está se rebelando contra esse tipo de coisa. Por isso que digo que chegamos ao limite do que nos separa da irracionalidade”.

A reação das pessoas, quando informadas do problema, também foi contada por José Vicente: “Os grupos que se formaram no entorno desse Movimento AR são pessoas da sociedade que tradicionalmente não estavam agrupadas dentro dessa agenda. Mas agora elas entenderam que precisavam dar um passo adiante, que era criar um grande grupo de formadores de opinião em uma barricada contra esse estado de coisas.

Nas conversas, existe pelo menos uma convergência de que chegamos ao fundo do poço e de que precisamos dar um salto em todas as direções. Mas principalmente no que diz respeito às ações das forças de segurança em relação ao jovem negro”.

Em outro trecho, ele aponta soluções: “Precisamos criminalizar de forma rigorosa esse tipo de conduta. Não basta afastar o policial ou transferi-lo para o serviço administrativo, ou instaurar inquérito na Corregedoria, pois a gente não sabe o que acontece lá dentro. Os casos se diluem dentro das instituições. Um agente do Estado que transgride as normas para violentar os direitos de um cidadão tem de responder por crime hediondo, inafiançável e imprescritível. O pano de fundo é que nossas forças de segurança são tomadas pelo espírito e pela crença da contenção social. O inimigo da polícia é o povo pobre que coloca em risco a tranquilidade da classe média e da elite brasileira. Em relação aos brancos, os negros brasileiros têm menos escolaridade, acesso à saúde e emprego, morrem em intervenções policiais. Precisamos transformar a polícia em uma polícia cidadã, desmilitarizando-a. Precisamos desconstruir essa crença de que a corporação existe para combater ao invés de proteger.

Também precisamos ter um controle mais efetivo das instâncias da sociedade, sem corporativismo. O Ministério Público, que faz esse controle externo da atuação policial, não cumpre seu papel. As assembleias legislativas têm instâncias de monitoramento, mas também não atuam nesse sentido. O mesmo ocorre no Tribunal de Contas, no Judiciário, na Defensoria… Por causa disso, a atuação policial não tem controle, transparência e participação da sociedade. Quem constrói a política de segurança pública no Brasil é a polícia, e não pode ser ela. Tem de ser a sociedade”.

Urbem
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A Editora Urbem faz parte do Grupo Novo Dia e edita livros de diversos assuntos e também a Urbem Magazine, uma revista periódica 100% digital.
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