Durante quase toda a história do mundo aprendemos que uma delegacia de polícia, um quartel de policiais militares são lugares seguros. Praticamente invioláveis. Detestados e evitados pelos que trilham o caminho do crime. Essa história está mudando. Graças à ineficácia das leis, à ousadia da marginalidade, ao apoio prestado por alguns organismos que juram defender os direitos humanos.
A delegada que preside o sindicato dos policiais civis de São Paulo reclamou há algumas semanas da falta de segurança nas delegacias de polícia. Isso porque, em Tremembé, um grupo invadiu a delegacia local e conseguiu roubar armas, recuperadas tempos depois. Se um delegado reclama que falta segurança na própria delegacia, dá para imaginar o que um cidadão comum teria para se queixar.
Um exemplo mais próximo e mais recente está em Jundiaí. No final de semana, um depósito de carros apreendidos pela polícia foi invadido. Carros foram roubados, e até terça-feira dois tinham sido recuperados – um perto do depósito, que fica no Jardim Novo Horizonte, e outro na casa de um cidadão, que alegou desconhecer a origem de um carro. Em sua garagem.
Há algum tempo, havia se tornado um fato comum o ataque de bandidos às bases da Polícia Militar. Hoje eles estão bem mais raros, e acontecem vez ou outra quando quadrilhas atacam bancos em cidades pequenas, bem interioranas. Nesses casos, vale tudo – ataque a delegacias, a quartéis da PM e até a guardas noturnos.
Essa situação é consequência de fatos que aconteceram há muitos anos e não foram levados a sério. Quando se misturou presos políticos com presos comuns, nasceram as facções. Os presos políticos ensinaram aos comuns que o segredo era se organizar e todos falarem a mesma linguagem. Hoje é inegável o poder dessas facções, com algumas, como o PCC, tendo ramificações em países vizinhos.
Quando o tráfico passou a dominar as favelas e morros cariocas, pouca importância se deu ao fato. Há quem diga que esse domínio foi resultado de um acordo de quadrilhas com o então governador do Rio, Leonel Brizola. Esse poder cresceu e fugiu do controle. Na época, houve políticos que justificaram a leniência: o tráfico não mata, compra droga quem quer, e em área de traficante reina a paz.
Com mais dinheiro e mais poder, as quadrilhas passaram a contar com armas mais potentes e letais. Houve casos de metralhadoras .50 montadas em carros para enfrentar a polícia. E uma .50 era usada em guerras passadas para derrubar aviões. Não se faz assalto com um revólver 38 – agora é com fuzil automático e pistolas de última geração.
Os governos demoraram muito para acordar e se mexer. Só recentemente os policiais paulistas passaram a portar pistolas .40. Mas a bandidagem está mais adiantada, e prefere as Glock. A Guarda Metropolitana da Capital foi duramente criticada por comprar fuzis por conta de uma emenda parlamentar. E as guardas municipais são hoje um apoio e tanto nas ações policiais. Tomou pau o deputado que fez a emenda e a própria guarda.
Criticar ações policiais é atualmente o assunto preferido de boa parte da imprensa. Se atira é porque atirou, se não atira é covarde e ato de omissão. Se prende é injustiça. Se não prende é cúmplice. E quando prende, há a audiência de custódia, que via de regra coloca criminosos nas ruas novamente. Se ficam presos e são condenados, marginais têm privilégios incomuns a quem trabalha. Têm direito até a sair da cadeia e passar dias fora, junto com amigos e com família. Muitos não voltam e acabam presos novamente por acaso.
E enquanto tudo isso acontece, 513 deputados e 81 senadores se refestelam em seus privilégios. O próprio poder judiciário parece gostar dessa situação. Gosta tanto que o STF até limitou as entradas da polícia carioca nas favelas. E o povo que se f#d@.
Anselmo Brombal – Jornalista