Empossados há nove dias, o CEO das Lojas Americanas (AMER3), Sérgio Rial, e o CEO, André Covre, renunciaram aos cargos na última quarta-feira (11) após a descoberta de “inconsistências contábeis” de 20 bilhões nos balanços da empresa.
A companhia identificou a existência de operações de financiamento de compras, nas quais a varejista é devedora, e que não estão adequadamente registradas nas demonstrações financeiras divulgadas no 3° trimestre do ano passado.
De acordo com a empresa, ainda não há como precisar os impactos desta descoberta nos resultados e no balanço patrimonial. A notícia, divulgada por meio de fato relevante na noite de ontem, caiu como uma bomba no mercado e investidores se perguntam se estão diante de um novo “IRB” – ressegurador que descobriu fraudes nos balanços em 2020 e viu suas ações despencarem 90% desde então.
Para mensurar a dimensão desta dívida, o valor de mercado da Americanas na última sessão era de apenas R$ 10,8 bilhões. Isto é, praticamente metade do montante. As inconsistências contábeis também são praticamente equivalentes ao valor de mercado do Magazine Luiza (R$ 20,4 bilhões), a principal varejista da Bolsa, e também das Lojas Renner (R$ 20,6 bilhões).
E as ações?
As notícias para quem têm AMER3 na carteira não são boas. O esperado é que as ações sofram uma queda brusca durante o pregão desta quinta (12) e não se sabe, ainda, qual será o fundo. Na manhã de hoje, o site de Relações com Investidores da Americanas (AMER3) ficou fora do ar.
“Tem muita cara de ser fraude e o mercado detesta isso. A nova administração não renunciaria se não fosse algo muito ruim e provavelmente o negócio está bem feio. A porta pode ficar pequena para o investidor que precisa sair desse papel”, afirma Pedro Menin, sócio-fundador da Quantzed, casa de análise e empresa de tecnologia e educação financeira para investidores.
Menin afirma que o impacto no balanço é de R$ 20 bilhões, mas que ainda não é possível dimensionar o tamanho real desta dívida. A recomendação é que os investidores fiquem o mais longe possível do papel.
“Com certeza, enquanto o mercado não tiver um tato melhor do que aconteceu de fato, ficará essa dúvida. Outro ponto também é quem são os bancos credores. Dependendo do tamanho buraco, se a Americanas der default (não pagar a dívida), pode contaminar a indústria”, diz Menin.
A mesma visão de Rodrigo Cohen, analista CNPI e co-fundador da Escola de Investimentos, empresa de educação financeira. “O comunicado foi catastrófico. É uma notícia muito complicada, o papel vai abrir lá embaixo, os investidores vão querer sair dele o mais rápido possível”, diz.
A Ágora Investimentos colocou os papéis da Americanas em “revisão”. Outras casas como XP, Citi, Itaú e Bradesco BBI também suspenderam as recomendações.
Fernando Ferrer, analista da Empiricus, ressalta que as investigações estão em caráter preliminar e que não está claro se foi fraude ou não. Entretanto, a dívida de R$ 20 bilhões faz com que o patrimônio líquido da Americanas fique negativo. Isso significa que os valores que a varejista tem a pagar superam a soma de todos os ativos da empresa.
“Se realmente for desse tamanho, a Americanas precisará fazer um aumento de capital para cobrir esse rombo. Isso pode respingar em outros papéis que os controladores da Americanas tenham”, diz Ferrer.
O fundo de private equity 3G Capital, acionista de referência da varejista, pertence aos brasileiros Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira. Eles também têm uma posição relevante na Ambev (ABEV3).
“Além disso tudo, nós já éramos céticos com Americanas. Um corpo operacional muito ruim, junto com um momento macroeconômico também ruim. E agora, dúvidas sérias sobre inconsistências contábeis e eventualmente até uma fraude, que deve ser danosa para a reputação do grupo”, afirma Ferrer.
Fábio Sobreira, analista chefe e sócio da Harami Research, vê a eventual necessidade de aumento de capital ou até mesmo de um processo de recuperação judicial. “Talvez a ação caia 20%, 30% ou até mesmo 40%”, afirma. “Se realmente for comprovada a irregularidade, serão anos para recuperar a credibilidade.”
De 2018 para cá, a companhia já vinha mostrando dificuldades em manter a margem líquida, segundo Mario Goulart, analista de investimentos e criador do canal no Youtube ‘O Analisto’. Em 12 meses, a AMER3 já registra uma derrocada de 56%.
Agora, com o rombo bilionário, maior que o valor de mercado da própria varejista, a perspectiva é de que o cenário fique cada vez mais complexo. “Não recomendo entrar. Empresa que dá prejuízo e está endividada, já não recomendo entrar por princípio. E nesse momento, menos ainda”, afirma Goulart.