As três cidades da região metropolitana de São Paulo mais afetadas pela forte chuva que deixou pelo menos 24 pessoas mortas no Estado passaram por um grande boom habitacional nas últimas três décadas, fenômeno que, segundo urbanistas, contribuiu para a ocupação desenfreada de áreas com risco de deslizamentos e inundações.
Em comum, os municípios de Francisco Morato, Franco da Rocha e Embu das Artes, onde 16 vítimas viviam, registraram um crescimento da população bastante superior ao computado na capital paulista e na região metropolitana, que compreende 39 cidades. Boa parte desse contingente foi viver em encostas de morros e margens de rios e córregos, ficando sujeita a sofrer com deslizamentos e enchentes.
Para urbanistas ouvidos pela BBC News, o boom habitacional se acentuou a partir dos anos 1990. Combinado a construções frágeis em um relevo de morros e à falta de políticas públicas de moradia e urbanização, o fenômeno contribuiu para que tragédias como a do fim de semana se tornassem recorrentes na região.
Segundo levantamento da TV Globo, pelo menos 120 pessoas morreram em decorrência das chuvas entre 2016 e 2022 na Grande São Paulo. As mortes ocorreram principalmente em virtude de deslizamentos, inundações e desabamentos de moradias. Em 2015, durante um episódio semelhante, 25 pessoas morreram em cidades como Francisco Morato, Franco da Rocha e Mairiporã.
Em Francisco Morato, três crianças e um adolescente morreram em um deslizamento nos últimos dias. A cidade é um exemplo desse crescimento acentuado nas últimas décadas. Entre 1990 e 2020, a população do município aumentou 134%, segundo projeção da Fundação Seade, órgão de análise de dados do governo de São Paulo, que se utiliza de informações do IBGE. Em 1990, eram 74.699 habitantes – três décadas depois, eram 174.403 pessoas.
Franco da Rocha foi onde oito pessoas – quatro vítimas da mesma família – morreram em um deslizamento no fim de semana. O município registrou aumento populacional de 87% – de 81 mil habitantes em 1990 para 148 mil moradores três décadas depois. Embu das Artes, com cinco vítimas da mesma família na última chuva, teve alta de 82% (de 148 mil para 270 mil).
Mas não apenas as cidades afetadas pelo último temporal registraram fenômeno semelhante. Mairiporã, que nos últimos anos também sofreu com mortes causadas por deslizamentos, teve uma alta de 193% em sua população entre 1990 e 2020 (de 33 mil para 98,6 mil habitantes). Já Caieiras, que também enfrenta problemas com alagamentos, saiu de 37 mil moradores em 1990 para 100 mil três décadas depois – alta de 170%.Segundo a Fundação Seade, o boom populacional nesses municípios é bastante superior ao crescimento da capital paulista, que marcou alta de 29% no mesmo período, e da região metropolitana como um todo, que cresceu 40%.