A solidão está deixando de ser encarada como um problema individual para se tornar uma preocupação de saúde pública. Estudos cada vez mais apontam que a falta de conexões sociais está relacionada a várias doenças, sendo considerada um fator de risco comparável ao tabagismo e à obesidade. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o isolamento social está se tornando uma epidemia, afetando um em cada quatro adultos e entre 5% e 15% dos jovens em todos os países.
Segundo a OMS, a solidão pode aumentar o risco de morte em 25%, o de demência em 50% e o de doença cardiovascular em 30%. Recentemente, a organização criou a Comissão de Conexões Sociais para priorizar o tema globalmente e propor soluções.
Estudos destacam o impacto da solidão na saúde, com um artigo recente revelando que o fenômeno afeta jovens e idosos em todo o mundo, em áreas urbanas e rurais, independentemente da riqueza do país. A falta de contato social e participação em atividades em grupo tem sido associada a um aumento da mortalidade, doenças cardiovasculares, acidentes vasculares cerebrais e pneumonia.
Uma revisão de estudos com mais de 1 milhão de pessoas, publicada no PLOS One no ano passado, mostrou um aumento de 33% na mortalidade por todas as causas em pessoas solitárias. Outro estudo, publicado no Journal of Aging and Health, com quase 8 mil idosos, reforçou esses resultados.
Solidão e maus hábitos
Essas pesquisas indicam que pessoas com poucas interações sociais tendem a adotar comportamentos menos saudáveis. Elas praticam menos atividades físicas, têm uma alimentação mais inadequada, consomem álcool e tabaco em excesso, além de serem menos propensas a seguir corretamente o tratamento médico ou realizar consultas de rotina. Além disso, a solidão pode afetar a autoestima e aumentar o risco de problemas de saúde mental, como depressão e ansiedade.
“Esses estudos se basearam nas chamadas ‘blue zones’ (regiões no planeta com maior número de idosos centenários), onde a interação social é fundamental e contribui para a longevidade dos idosos”, explica a geriatra Maysa Seabra Cendoroglo, do Hospital Israelita Albert Einstein e da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Nestas regiões, os idosos geralmente têm grupos com os quais se responsabilizam por amigos e colegas, formando uma rede de apoio.
Países desenvolvidos estão conseguindo criar mais políticas públicas para enfrentar esse problema. Um exemplo é a campanha contra a solidão lançada na Inglaterra, que também possui um ministério dedicado ao tema. Barcelona é outra cidade que adotou um plano com estratégias definidas para os próximos anos.
“O Brasil está envelhecendo e só agora estamos percebendo isso. Infelizmente, ainda existem restrições à participação dos idosos na sociedade, e o país não pode mais se apoiar na sua fama de acolhimento, já que os estudos mostram que a solidão é um problema aqui também”, afirma a especialista. “Essa situação só mudará quando os idosos puderem se integrar mais e participar de diversos trabalhos e atividades”.
Solidão x isolamento social
Embora sejam semelhantes, solidão e isolamento social não são a mesma coisa. Uma pessoa pode se sentir solitária mesmo estando cercada por outras pessoas – os cientistas afirmam que tanto o sentimento de solidão quanto o isolamento social podem causar doenças.
“A solidão é inerente ao ser humano, mas se intensifica quando a pessoa não encontra significado em seu contexto ou pessoas que compartilhem seus valores”, explica a geriatra do Hospital Albert Einstein. “Quanto mais interações sociais, menos solidão. Quanto mais a pessoa se arrisca, maior a chance de encontrar afinidades e se sentir acolhida. Isso deve incentivá-la a buscar novas oportunidades.”
Não podemos sempre contar com a presença da família, mas sempre é possível fazer novas amizades e contatos. Por isso, é recomendável participar de programas em comunidades religiosas, centros esportivos, associações de bairro e unidades que ofereçam atividades para esse público – e até mesmo trabalhos voluntários, por exemplo.
Além disso, é importante cuidar da qualidade dessas relações. Nesse sentido, as redes sociais podem tanto ajudar quanto atrapalhar. “Embora facilitem as conexões, é necessário ter cuidado para não desperdiçar tempo interagindo com pessoas que não agregam valor à sua vida.”