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sexta-feira, 22 novembro, 2024

Sem movimento dos braços, maquiadora realiza seus sonhos

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Desde criança, a mineira Clélia Rodrigues demonstrava habilidade com atividades ditas “manuais”: escrever, colocar a linha na agulha, desenhar…

Só que tem um detalhe: ela não usa as mãos. Não porque não as tem, mas devido a uma condição que a faz não conseguir movimentar os braços. Muito do que normalmente se faz com a mão, Clélia, hoje com 27 anos, faz com a boca.

Na escola da pequena Teixeiras (MG), ela lembra que era sempre uma das primeiras a terminar de copiar o quadro nas folhas do caderno. Cozinhar sempre foi um prazer — e, apesar de que cortar legumes e carnes seja uma tarefa mais árdua para ela do que para quem usa as mãos, ela está sempre na cozinha testando receitas para o marido e a filha.

Mas foi outra paixão que virou profissão: a maquiagem.

Com pincéis e lápis na boca, ela delineia, esfuma e contorna com uma habilidade que impressiona clientes e seguidores nas redes sociais.

“Seu trabalho é incrível, arrasa demais”, comentam seguidores de Clélia.

Clélia sempre viu de perto como funciona a rotina da beleza, especialmente de mulheres. A mãe, Rita, fazia cabelos, maquiagem e pintava unhas na casa de clientes e em salões de Teixeiras e, depois, de Visconde do Rio Branco (MG), para onde se mudou.

Quieta e sentada, enquanto a mãe atendia as clientes, a pequena Clélia notava o bem que os cuidados com a beleza faziam àquelas mulheres.

“Achava lindo elas saírem felizes porque estavam mais bonitas e ver como aquilo era importante para a autoestima”.

Por volta dos 15 anos, com a vaidade da juventude mais aflorada, Clélia usou a expertise dos salões para maquiar as amigas “até para ir na padaria”: “Elas nem estranharam [maquiar com a boca], porque elas já sabiam que eu fazia as coisas assim”

Até os 24, a atividade continuou só como hobby. Foi quando percebeu que podia, como qualquer outra maquiadora que usa as mãos, trabalhar profissionalmente com maquiagem.

Os primeiros testes foram com clientes apresentadas pela mãe. Depois, passou a postar vídeos no YouTube e Facebook.

Em alguns, com o pincel fixo na penteadeira e movimentando a cabeça, ela conseguia fazer a própria maquiagem. Em outros, mostrava a rotina em casa e a técnica usada nas clientes.

Os vídeos não chegavam a repercutir tanto, mas foram suficientes para Clélia receber convites de maquiadoras profissionais para fazer cursos e workshops.

Para trabalhar, a mineira usa adaptações: para não ter contato com a boca, a esponja é colocada no fim de algum cabo comprido. Já o batom é retirado do recipiente tradicional e aplicado com um pincel. Coisas que precisam ser feitas com a mão, como passar um creme ou puxar o olho para passar o lápis, ela pede a ajuda das clientes.

“Me adapto do jeito que posso e não fico pensando ‘ai, eu não consigo'”.

Quando o trabalho começou a engrenar, porém, veio a surpresa: Clélia estava grávida do marido, Lucas, com quem havia se casado 2 anos antes. Um remédio para emagrecer acabou cortando o efeito do anticoncepcional.

“Foi um milagre. A gente tinha combinado de adotar, porque eu não teria condições, pelo meu corpo, de carregar uma barriga com uma criança.”

Mas Clélia carregou. Passou os 9 meses de repouso, sem trabalhar, já que o peso era muito grande para seus pés.

Yasmin nasceu no início de 2020, pouco antes da pandemia. Os planos de Clélia para voltar a maquiar foram suspensos – como ela usa a boca (portanto, sem poder vestir máscaras) e o contato é muito próximo das clientes, não podia colocá-las em risco.

Enquanto o coronavírus não dá trégua, Clélia aprendeu novas ferramentas, dessa vez nas redes sociais.

Usando o nariz, ela escreve e edita os próprios vídeos, como os que foram parar no TikTok, rede onde já tem mais de 200 mil seguidores.

Os novos vídeos são feitos com a mãe ou com uma funcionária que a ajuda em algumas tarefas de casa que exigem o uso das mãos, como carregar a filha bebê, tomar banho e trocar de roupa.

Quando a pandemia passar, ela espera colher os frutos da “fama” repentina: “Meu sonho é dar palestras sobre maquiagem. Não só contar técnicas, quero contar minha história, para inspirar que todos podem ser o que quiser”.

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