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sábado, 23 novembro, 2024

Quantos milhões de quilômetros Manelão já rodou?

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Aos 80 anos, Manoel Dantas Pereira, o Manelão, continua trabalhando, dirigindo seu caminhão de mudanças. Não só por aqui – ele já rodou o Brasil inteiro

Se alguém perguntar quem é o cidadão Manoel Dantas Pereira, poucos saberão responder. Mas se esse mesmo alguém perguntar quem é o Manelão, a resposta é unânime: é o cara das mudanças. Em atividade desde 1967 (oficialmente), ele é o mais antigo no ramo em Jundiaí e perdeu a conta de quantos quilômetros e quantas mudanças já vez na vida.

Mas nem sempre foi assim. Manoel nasceu em Caicó, no Rio Grande do Norte, em janeiro de 1941. Aos oito anos, com a família – José, o pai, e Noemia, e nove irmãos, veio para São Paulo. Chegou a Presidente Prudente depois de 29 dias viajando num pau-de-arara, numa época em que as estradas eram de chão batido e não havia postos de apoio no percurso. Na realidade, sua mãe teve 17 filhos, mas onze morreram. Noemia Maria da Conceição, a mãe, morreu no ano passado, faltando três dias para completar 100 anos.

Em Prudente, a família se empregou uma fazenda de algodão – e lá ia o Manoel (na época Manezinho) colher algodão depois das aulas. Tempos depois a família se mudou para Cornélio Procópio, no Paraná, na colheita do café, e por lá ficou seis anos. Com 17 anos, o agora já Manelão, foi trabalhar em Piracicaba, numa das maiores metalúrgicas da época, a Dedini. E depois de um tempo, sozinho se mudou para Santos. Numa construtora, conseguiu emprego e uma aventura: a construção da Rodovia Castello Branco, a partir de São Paulo. “Trabalhamos até onde o governo pode pagar; quando acabou o dinheiro, parou a estrada, do jeito que está até hoje – no fim da Castello, de um lado você vai para Avaré, de outro para Botucatu”, conta ele.

Foi então que resolveu vir para Jundiaí, sozinho novamente. Jovem e impetuoso, foi trabalhar na Cica. E lá mostrou que não era fraco. Acostumado a lutar boxe – que hoje detesta – Manelão carregava duas sacas de 60 quilos de uma só vez – e uma das sacas era erguida acima da cabeça com uma mão só. Parte da fábrica parou para ver a proeza. Mas sua vocação estava no volante.

Comprou um caminhão Chevrolet 51 e começou a fazer mudanças com o caminhão de carroceria seca. “Mas não era exclusivamente mudanças – explica Manelão. Eu pegava o frete que aparecia. Podia ser areia, tijolo, madeira, o importante era trabalhar e não deixar o caminhão parado. E com o trabalho, foi trocando de caminhão – um Ford, outro Chevrolet e finalmente o Mercedes 321 cara chata, fabricado em 1959. Foi então que comprou um baú que havia pertencido a uma distribuidora de doces e passou a se dedicar somente a mudanças. A carta de motorista foi tirada em 1964, mas antes o jeito era andar sem carta mesmo. Mas era um exame difícil. “A gente tinha de dar os nomes das peças mostradas pelo examinador e ainda explicar pra que serviam”, lembra ele.

Nunca ficou na estrada, resultado do aprendizado e da curiosidade na construção da Castello Branco. “Na obra, eu movimentava as máquinas pesadas, como a D-8, conta ele. E quando quebrava, a gente tinha de se virar. Aprendi a trocar óleo do motor Caterpillar – é o único que a gente faz a troca com ele funcionando, e não perdia oportunidade de aprender”.
Prevenido, examina o caminhão inteiro antes de pegar estrada. Nâo manda para a oficina – faz pessoalmente uma revisão geral, e só dá a partida quando tem certeza que tudo está em ordem. Imprevistos sempre acontecem, mas quebra mecânica nunca aconteceu. “Uma vez fiz uma viagem, e depois de dirigir muitas horas, parei num posto, ele conta. Resolvi dormir embaixo do caminhão, pois o lugar era perigoso. Mas a canseira me derrubou, e acordei com água me encobrindo. Nem havia notado que estava se formando uma tempestade”. Dormir, nunca em hotel. “Sempre dormi no caminhão”.

Suas mudanças se tornaram conhecidas. “Fiz inúmeras viagens ao Nordeste – até perdi a conta – principalmente de nordestinos que vieram estudar em São Paulo, principalmente Medicina, e depois de formados, retornavam à cidade natal para clinicar. Além da mobília, a mudança em si, eles sempre levavam aparelhos de ar condicionado”. E isso foi aumentando sua fama. Chegou a fazer 30 mudanças num mês, mas hoje essa frequência é menor.

Viajou praticamente para todos os estados brasileiros, do Sul a Norte, sem nunca se atrasar.
Manelão se aperfeiçoou. Notando os problemas típicos de uma mudança, passou a fornecer caixas de papelão para embalar pertences das famílias, e papel para embalar vidros, como copos e cristais. Jà fez mudança de muita gente famosa mais de uma vez, e até de casais que se separaram. Tornou-se amigo de seus clientes, a ponto de alguns seguirem viagem de avião para seu destino, deixando as chaves de casa com ele. Muitos mandam mensagens de agradecimento, avisando que nenhum copo foi quebrado, que a mudança chegou inteira, e que correu tudo bem. Um deles, que fez mudança no começo de fevereiro, mandou esse tipo de mensagem e ainda avisou que assim que for possível vai devolver suas caixas.

Suas lembranças sempre são positivas, mas não deixam de comparar o tempo atual com outros tempos. “Hoje é mais fácil, é direção hidráulica, câmbio automático, ar condicionado, mas antes – conta – era na base do feijão. Câmbio seco, que você tinha de dar tempo na embreagem pra engatar, e pra se ter uma ideia, as máquinas na época da construção da Castello Branco, não era hidráulicas, eram na base do cabo de aço. Imagina força que precisava para mover uma máquina de terraplenagem”.

Quantos quilômetros já rodou não estão calculados, mas pelas suas viagens devem ser alguns milhões. “Conheço a estrada Rio-Bahia como poucos”, brinca. Casado com Fátima há sete anos (sua segunda mulher), pretende trabalhar até onde der. E já passa sua experiência ao filho Rafael Tadeu, que o ajuda no trabalho. E agora não é apenas um caminhão – são quatro, de diversos tamanhos. E se antes a publicidade na TV era “Mãe, o caminhão da Granero chegou”, hoje seria: “Mãe, o caminhão do Manelão chegou”.

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A Editora Urbem faz parte do Grupo Novo Dia e edita livros de diversos assuntos e também a Urbem Magazine, uma revista periódica 100% digital.
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