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sábado, 23 novembro, 2024

Pandemia faz crescer o consumo de bebida alcoólica no Brasil

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Nunca se bebeu como agora. Isolamento, depressão, falta do que fazer são convites ao primeiro, segundo, terceiro goles…

O consumo de bebida alcoólica aumentou durante a pandemia. O isolamento social forçado e as festas restritas não impediram que muita gente levasse o bar para dentro de casa. O crescimento nas vendas começou logo após a confirmação dos primeiros casos de Covid no Brasil. Segundo a plataforma Compre&Confie, entre 24 de fevereiro e 3 de maio de 2020, o “boom” foi de 93,9% em comparação ao mesmo período de 2019.

Mesmo com muitos bares fechados, o mercado de drinques continuou em alta no ano passado. Pesquisa da Fiocruz, Unicamp e UFMG revelou aumento de 17,6% no consumo de bebidas alcoólicas, justificado principalmente pelo aumento do estresse e pela sensação momentânea de relaxamento. Nos primeiros meses da pandemia, as redes de supermercado mantiveram incremento médio de 27% na venda de produtos alcoólicos.
O fenômeno se repetiu em outros países. Um estudo realizado por pesquisadores da Escola de Saúde Pública Global da Universidade de Nova Iorque apontou que, dos quase 6 mil entrevistados, 29% relataram aumento no uso de álcool durante a pandemia. Outra pesquisa conduzida pela Rand Corporation aponta crescimento de 14% no consumo de álcool entre adultos com mais de 30 anos nos Estados Unidos.

Para a Organização Mundial da Saúde, os números são preocupantes, agravados no Brasil pelo fato de o abuso de álcool ser considerado o principal responsável pela morte de jovens entre 15 e 19 anos, seja em acidentes ou por paradas cardíacas. Segundo o IBGE, outro dado alarmante: cerca de 1,5 milhão de adolescentes de 13 e 14 anos já experimentaram bebida alcóolica.

Neste contexto, o dia 20 de fevereiro – considerado o Dia Nacional de Combate às Drogas e ao Alcoolismo – ganhou mais relevância neste ano. Para o professor do curso de Psicologia do Unicuritiba, Perci Klein, ainda que seja considerado uma doença – com fatores genéticos e hereditários associados –, é impossível dissociar o alcoolismo do meio social em que as pessoas estão inseridas.

Mestre em Psicologia da Saúde com atuação em psicologia social, dinâmica das relações interpessoais e psicologia da comunicação, Klein lembra que a própria sociedade torna aceitável o consumo do álcool. “Em muitas famílias o alcoolismo passa de geração em geração, mas o problema vai além. A bebida é culturalmente aceita em nosso país. A questão é que a mesma sociedade que abre as portas para o consumo do álcool desde a adolescência é aquela que fecha as portas para quem pede ajuda para se livrar do vício”, comenta o professor.

Segundo o especialista, há um movimento implícito para que adolescentes comecem a beber e isso é encarado com naturalidade no Brasil. “Aquele que não bebe é visto como estranho ou diferente. Mas quem bebe demais fica estigmatizado, é hostilizado, sofre preconceito e encara uma série de problemas físicos, emocionais e psicológicos, com reflexos em sua vida profissional, familiar e social. É essa incoerência que precisamos resolver e combater.”

O consumo do álcool é tão naturalizado, aponta o psicólogo, que muitos pais ou familiares demoram a perceber quando a bebida se tornou um problema ou não acreditam que alguém querido será acometido pelo vício. “O melhor caminho para a prevenção é o diálogo, a interação, o olhar cuidadoso e a atenção dos pais ao comportamento dos filhos, ao rendimento escolar, às formas de socialização”, ensina Klein. “Não dá para trancar os filhos em casa, mas ser um pai presente e mostrar os reflexos do alcoolismo na vida e no futuro é plenamente possível.”

Na mesma medida em que a pandemia fez crescer o consumo de bebidas alcoólicas, o professor propõe um desafio às famílias: transformar o período de isolamento em tempo de qualidade. “Se a pandemia nos obrigou a ficar mais tempo em casa, que possamos retomar os almoços à mesa, todos juntos, exercitando a escuta, nos reaproximando dos filhos, ouvindo o que eles têm a dizer. Que esse tempo seja uma oportunidade para uma conversa franca, um momento para os pais perceberem o que se passa com os filhos.”

A qualquer sinal de que o consumo de álcool tenha se tornado recorrente – ou ainda exista a suspeita do uso de drogas ilícitas, o professor Perci Klein recomenda que a família busque ajuda profissional. “O abuso de álcool e drogas pode ter inúmeras causas e fatores relacionados, muitas vezes difíceis de compreender. Por isso, é importante contar com suporte especializado, tanto para o dependente quanto para os familiares, que também sofrem com a situação”, explica.

Seja qual for o caso, continua o psicólogo, diálogo, afeto e compreensão serão sempre essenciais ao longo de todo o tratamento. “O alcoolismo já traz sofrimentos suficientes a todos os envolvidos e o dependente não deve sofrer com mais preconceito ou mesmo com a vergonha da família. O apoio nos momentos de altos e baixos, nas recaídas e nas fases difíceis é muito importante”.

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