Na Jundiaí dos anos 1970 não havia motéis. Os encontros proibidos aconteciam em algumas casas de viúvas que alugavam quartos e em algumas pensões. Até que foi inaugurado um motel, na margem da ia Anhanguera, o Motel 46. O nome era do mesmo quilômetro da rodovia. Motel meio tôsco, sem conforto e sem qualquer privacidade.
Os quartos ficavam num longo corredor, e no fim desse corredor, o banheiro com chuveiro. Era um perereco na hora do banho. Nos quartos, apenas a cama e um abajur que nunca funcionava. E quem saía de Jundiaí para ir ao 46 tinha de fazer o retorno na Anhanguera em Jordanésia, no km 39. Uma aventura, numa época em que só havia Fusca, Kombi, DKW e alguns carrões americanos, que todo mundo sabia de quem era.
Foi nesse motel que Laurinda, filha de dona Lazinha, notória fofoqueira, viveu uma de suas aventuras. Laurinda não tinha o mesmo comportamento das moçoilas de sua idade. Desde os 16 anos dava mais que xuxu na cerca. Dava em tudo quanto é lugar – no fundo da casa, embaixo do abacateiro, atrás do coreto da praça, em casas em construção, no banco de trás do carro, no muro, em pé. Onde tinha chance Laurinda levantava a saia. Dona Lazinha tentava, mas não conseguia controlar a mocinha.
Até que um dia Laurinda conheceu um sujeito, vindo de São José do Rio Preto, e que tinha de ficar em Jundiaí por uns dez dias. Ele trabalhava numa seguradora, ganhava bem, e como Laurinda era bonita e gostosa, resolveu comer a mocinha. Mas tinha de ser com conforto, com privacidade, com tranquilidade. Acabaram indo no Motel 46, onde entraram sem problemas, sem apresentar carteira de identidade. Na época, a Polícia tinha a Divisão de Costumes, que fiscalizava a frequência nos hotéis. E o motel era considerado um hotel.
A farra foi boa, e lá pelas duas da manhã resolveram que era hora de ir embora. Mas antes, o banho. Laurinda saiu enrolada na toalha, e como a porta do banheiro no fim do corredor estava aberta, foi entrando. Tomou um susto. Embaixo do chuveiro estava sua vizinha, Jussara, uma viúva que não perdia tempo. E com ela, dividindo o chuveiro, o Mané da mercearia. Passada a surpresa, as duas resolveram conversar, e dessa conversa saiu a promessa de segredo. Uma não contava da outra e estava tudo bem. O Mané também prometeu ficar de bico fechado.
Passadas algumas semanas, teve encrenca na vizinhança. Lazinha havia descoberto algum podre de Jussara – até hoje não explicado – e esparramou a fofoca. E no bate-boca que se seguiu entre as duas, Jussara resolveu jogar na cara de Lazinha que a filha dela era biscate. E dizia que provava. Desafiada, contou a história do motel.
Foi pouco pra Lazinha quase enfartar. Quando Laurinda chegou, no fim da tarde, outro escândalo, com gritos e xingamentos.”Não criei filha pra ficar dando a bunda pra qualquer vagabundo”, gritava Lazinha. “A bunda é minha, a periquita é minha e dou pra quem quiser”, respondia Laurinda. As duas sossegaram lá pelas dez da noite, cansadas de tanto se xingarem. Jussara ouviu tudo, e resolveu esparramar a história, acrescentada do escândalo que acabara de ouvir.
E em poucos dias metade de Jundiaí sabia da história de Laurinda e Lazinha. Jussara teve o cuidado de falar que foi uma amiga sua, de Campinas, que ela não podia dizer o nome, quem vira Laurinda no motel. E Laurinda jurou que nunca mais iria a um motel com banheiro no fim do corredor.
O tempo passou e Jundiaí ganhou novos motéis, como o California, que numa época chegou a oferecer o Disk-Motel para casais que não tivessem carro. E quando chamado, lá ia um Fusca azulão todo escrito – nome do motel, número do telefone, o disk-motel… Mas tinha banheiro no quarto, era suíte. E na saída, o California dava uma calcinha de brinde.
Não se sabe se Laurinda casou, se Lazinha sossegou e se Jussara continua fofoqueira. O que se sabe é que hoje a cidade tem motel a dar com pau. Não se sabe se tem mais bar. Ou mais farmácia. Ou mais igreja evangélica. Ou motel. Ô gente pra gostar de foder!
Chico Malvadeza