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sexta-feira, 19 abril, 2024

Waldemar Haffkine, o pioneiro da vacina que o mundo esqueceu

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Atuando em Paris e na Índia na virada do século passado, Waldemar Mordecai Haffkine criou as primeiras vacinas do mundo contra cólera e peste. Mas um envenenamento acidental em massa fez sua vida degringolar

Em 1894, Waldemar Haffkine viajou para Calcutá em busca da cólera, e estava otimista para identificar casos porque aquele era o período do ano que a doença se espalhava com força. Ele havia chegado à Índia em março anterior portando o que acreditava ser uma vacina para a doença, mas lutou o ano todo para fazer progresso nos experimentos em torno de sua criação. Desde o momento de sua chegada, Haffkine foi recebido com ceticismo e resistência por parte do establishment médico inglês e da sociedade indiana.
Ele, que não havia se formado em Medicina, mas em Zoologia, era um judeu russo que se formou em Odessa e desenvolveu suas habilidades em Paris, numa época em que o mundo da bacteriologia internacional era dividido e cercado de suspeitas.

Haffkine, que tinha 33 anos quando desembarcou na Índia, também teve dificuldades com o lado prático de testar sua vacina. Sua primeira tentativa exigiu duas injeções, separadas por uma semana, e sua equipe às vezes tinha dificuldade para localizar cobaias para a segunda aplicação.

E apesar da ampla disseminação da cólera na Índia, encontrá-la em concentração suficiente não foi fácil. Haffkine inoculou 23 mil pessoas naquele ano no norte da Índia, de acordo com seus próprios registros, mas nenhum cólera apareceu entre eles para mostrar se a vacina tinha valor ou não.

Então, naquele ano, Haffkine deu um tempo. Ele havia sido convidado para Calcutá pela autoridade médica local a fim de tentar identificar o bacilo da cólera em um tanque de água de um vilarejo que consistia em um conjunto de cabanas de barro. As famílias que moravam nesses barracos bebiam coletivamente das fontes de água compartilhadas, o que as tornava vulneráveis ​​a surtos frequentes de cólera.

Para Haffkine, aquele cenário era um campo de experimentos ideal para sua vacina recém-criada. Em cada casa, ele tinha um grupo de pessoas vivendo em condições idênticas, igualmente expostas ao cólera. Se ele pudesse inocular parte de cada família e deixar parte sem tratamento, com participantes suficientes ele poderia finalmente produzir alguns resultados significativos.

No final de março, duas pessoas morreram de cólera no vilarejo de Kattal Bagan, o que indicava a ocorrência de um surto. Haffkine viajou para o local e inoculou 116 dos 200 habitantes. Depois, sua pequena equipe observou mais 10 casos lá, sendo 7 fatais — todos eles estavam entre os não inoculados.

Os resultados foram positivos o suficiente para levar as autoridades de Calcutá a financiarem um estudo mais amplo, mas convencer as pessoas a serem vacinadas era mais fácil na teoria. Anos e anos de programas de saúde enfiados goela abaixo pelo governo inglês tinham disseminado também a desconfiança na população, e muitos no país estavam alheios ao conceito de vacinação.

A solução de Haffkine foi trabalhar com uma equipe de médicos e assistentes indianos, em vez dos ingleses. E Haffkine tinha um novo truque no mundo da vacinologia – injetar-se publicamente para provar que achava que sua preparação era segura.

“O que é notável, e muitas vezes se perde na história, é que depois da resistência inicial as pessoas começaram a fazer fila nas favelas de Calcutá para a vacina de Haffkine contra a cólera. Elas passavam o dia inteiro na fila”, diz Pratik Chakrabarti, professor de História da Ciência e Medicina da Universidade de Manchester.

O trabalho de Haffkine nas favelas de Calcutá o colocou entre um seleto grupo de cientistas que foram os pioneiros em uma mudança profunda e global na maneira como as doenças eram compreendidas e tratadas. Mas ao contrário do pioneiro da vacinação, Edward Jenner, que atuou antes dele, e de Jonas Salk, que atuou depois, o nome de Haffkine nunca entrou realmente na memória do público, seja na Índia ou na Europa.

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