Fazer som ou ruído musical é coisa de mamífero, ave e passarinho. Alguns instrumentos são antigos, raros ou surpreendentemente simples. Os aborígenes australianos tocam uma enorme corneta chamada de didgeridoo, De som grave e alto, esta vuvuzela de metro é feita de eucalipto, bambu e até de PVC. A ocarina é pré-histórica; uma pequena flauta oval, de porcelana, barro, madeira ou pedra e é tocada por bolivianos, peruanos e veganos em feiras de artesanato. O nordestino gosta da flauta de pife e da rabeca (violino popular, de origem árabe, que faz som quando tocado com arco sobre três ou quatro cordas). Feito de taboca como as flautas dos índios, o pife ou pífano é soprado pelos sertanejos no carnaval, festa católica, forró etc. A viola de cocho é coisa do pantanal, uma tábua sem buraco com cordas, de som agradável, mostrada ao mundo por Helena Meirelles e Almir Sater.
Para fazer o didgeridoo, nativos costumam usar um tronco comido de cupim. Com mais de um metro e diâmetro entre 4 e 5 cm, tem bocal de cera de abelha ou borracha, conforme o som que se pretende. O pife ou pífano foi criado por nordestinos indígenas, copiando as flautas europeias. Outros nomes do pife são taboca e pífaro. Taboca é o nome tupi do bambu Guadua weberbaueri. A viola de cocho de 6, 8 e até 12 cordas, tornou a Dama da viola pantaneira, Helena Meirelles, em 1993 pela revista Guitar Player, entre as cem melhores instrumentistas do mundo, aplaudida pelo compositor/guitarrista Eric Clapton. O teremin emite sons sem ser tocado, basta se aproximar do instrumento. Foi inventado pelo russo Léon Theremin em 1919. Completamente eletrônico, tem duas antenas de metal que percebem a proximidade das mãos do artista (músico ou não). Os movimentos produzem sons, que estão em alguns clássicos do Led Zeppelin a Rita Lee, nas trilhas de ficção científica e até em filmes de terror.
O ukelin é uma mistura de guitarra havaiana (ukulele) e violino, tocado com arco sobre 16 cordas. Foi inventado em 1926 por Paul Richter e produzido por empresas americanas até o final do século. A vuvuzela é uma corneta ou aerofone africano com um metro, conhecida como xipalapala em Moçambique e feita com chifre de kudu (antílope com chifres em forma de saca-rolhas). É usada para anunciar festas e reuniões de tribos. Tornou-se símbolo do futebol africano; barulhenta, foi aprovada e reprovada pela Fifa após as copas de 2009 e 2010. Harmônica e Sanfona não são acordeão e gaita. Sanfona é instrumento de cordas desde o século IX, na Europa. Se parece com um violino, tem teclado e faz som de zumbido. Benjamin Franklin, inventor do para-raios, criou em 1761 a harmônica de vidro, parecida com o copofone. Para tocar, basta molhar os dedos e friccionar o conjunto de vidros. Esta harmônica foi usada por Mozart, Beethoven, Tchaikovsky e outros geniais compositores.
“Mas ‘chère’, não vai falar da caxirola?” Sim, como não criticar esta coisa mal feita, plagiada e superfaturada. Em 2012, o então ministro dos Esportes, o comunista Aldo Rebelo (hoje filiado ao Solidariedade), pediu ao camarada Carlinhos Brown para criar o instrumento oficial da Copa do Mundo Fifa 2014. Ai o lacrador baiano copiou o caxixi, chocalho de palha indígena usado na capoeira. Feita de plástico, a caxi rola foi patenteada em setembro de 2012 e aprovada pela presidenta Dilma no ano seguinte. Dinheiro pra cá, encomendas pra lá, Brown dizia que o som da caxi rola era mais agradável que o da pobre vuvuzela.
Ambientalistas entraram no debate, esculhambaram os camaradas por usar “polietileno verde, não degradável, que liberava gases estufa, mi mi mi…”. A estreia da caxi rola foi no jogo do clássico BaVi (Bahia x Vitória) em abril de 2013. Distribuídas de graça para os torcedores, as caxi rolas foram jogadas no campo e abandonadas nas ruas. Até a Proteção ao Patrimônio Afro-Brasileiro da Fundação Palmares entrou na briga. “Somos contrários ao registro desse objeto pela iniciativa privada sem que as comunidades tradicionais que criaram os instrumentos sejam beneficiadas”, afirmou Josilene Magalhães, diretora da Palmares. Muito dinheiro jogado fora e a caxi rola não lacrou.
GALDINO MESQUITA