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Jundiaí
quinta-feira, 28 março, 2024

Quem precisa de uma Cidade Compacta?

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O planejamento de uma cidade leva em consideração diversos aspectos, desde quem são as pessoas que estão naquele lugar, até a altura dos prédios que serão construídos, passando pelas ruas que serão desenhadas, as atividades econômicas que são desenvolvidas, os tempos e trajetos de deslocamentos, os equipamentos públicos, os direitos a serem respeitados, os recursos e reservas naturais, ou seja, a vida de um lugar.

Uma cidade com baixa densidade populacional – poucas pessoas ocupando o mesmo espaço – dispersa, com predomínio do transporte individual, com longos deslocamentos representa modelos de urbanização criados em meados do século 20 e que ainda hoje amparam muitas de nossas cidades.

O oposto disso, uma alta densidade populacional – muitas pessoas ocupando o mesmo espaço – deslocamentos em diversos modais de transporte, valorizando principalmente a mobilidade ativa e essencialmente os trajetos à pé, são desafios enfrentados pela contemporaneidade. Um dos resultados diretos da maior densidade populacional é a criação de edifícios altos e desconectados de seu entorno, gerando congestionamentos e até problemas de insolação e de ventilação.

Houston, Texas. Cidade Radial espraiada
Paris, França, Cidade Densa e com espaços públicos

A Cidade Compacta, termo técnico para uma corrente de planejamento, busca não só uma maior concentração de coisas e pessoas, mas também um equilíbrio entre suas funções. Se pensarmos a cidade à partir do ponto de vista das pessoas passamos a buscar alternativas para que suas necessidades, não apenas as das construções ou das máquinas que colocamos nas cidades, passem a ser consideradas no planejamento. Cidades construídas em “escala humana”, onde “vida, espaço, e prédios” são priorizados nesta ordem, buscando o equilíbrio entre densidade e mobilidade, passando pelo filtro da valorização da vida das pessoas que ocupam o lugar, de qual o espaço destinado a elas e de que forma as construções deste lugar respondem às suas necessidades são um dos principais objetivos de uma Cidade Compacta.

Porque compactar e não espraiar?

Espraiar uma cidade custa muito caro. Estes custos são cobrados de diversas formas, não apenas econômica ou ambientalmente, mas também pelo bem estar da população, por sua saúde (física e mental), pelo tempo gasto pela população em seus deslocamentos diários, pela diminuição da diversidade e do esgarçamento do tecido social. Espraiar uma cidade significa criar nova infraestrutura, aumentar o número de viagens, encarecer o valor da terra e transformar radicalmente uma localidade. Uma cidade que se espraia degrada o espaço urbano existente, cria valores artificiais encarecendo o preço da terra e acirra desigualdades sociais. Uma cidade espraiada separa usos e funções, afastando a moradia das áreas de lazer, emprego, estudo e serviço. Segundo pesquisa da Universidade de São Paulo, os congestionamentos geram prejuízos de 2,83% do PIB nacional e o setor de transportes é responsável por 60% das emissões de gases do efeito estufa. Mais de 100 milhões de brasileiros vivem sem acesso à coleta de esgoto segundo dados do IBGE. Nas cidades, a dispersão da população pelo território causa o aparecimento de loteamentos formais e informais, tanto de baixa quanto de alta renda, distante das áreas de empregos, sobrecarregando os sistemas de transporte. A população de baixa renda é a maior prejudicada de uma cidade espraiada.

A cidade é o lugar de encontro das pessoas. É talvez a maior forma de expressão de uma sociedade. Uma cidade não é formada apenas por suas ruas e prédios, mas por todas as relações que se criam pela população que a constrói todos os dias. A cidade encampa os sonhos, angústias, desejos, afetos e encontros de todos aqueles que formam este lugar. Uma Cidade Compacta favorece os encontros, diminui custos e promove uma continuidade do tecido social. Ela busca a diversificação dos padrões de moradia, integra espaços públicos e privados em favor dos pedestres e promove espaços públicos de permanência com áreas verdes estratégicas implantadas para reforçar a conexão entre os usos da cidade e o bem estar de seus habitantes. O foco na mobilidade ativa e no adensamento de regiões ao longo dos eixos do transporte coletivo produz uma cidade mais barata, saudável, dinâmica e agradável. O objetivo de uma Cidade Compacta está na busca do equilíbrio sustentável entre ocupação do território, adensamento populacional e construtivo em territórios com forte presença de infraestrutura urbana e um perímetro urbano delimitado de maneira estratégica.

Jundiaí é uma Cidade Compacta?

Ao sobrepormos o perímetro urbano de Jundiaí às regiões já urbanizadas da cidade, percebemos diversas áreas ainda a serem ocupadas. É possível constatar também uma zona já espraiada, no Vetor Oeste, que pouco se comunica com o Centro da cidade. Esse tipo de urbanização se construiu ao longo do tempo e de acordo com um tipo de pensamento de planejamento que acabou por criar ilhas de ocupação na cidade. Há, portanto, uma clara contradição entre o conceito de Cidade Compacta e a prática que estamos implantando na cidade. Assim, propor a expansão do perímetro urbano por razões que não sejam estritamente as da necessidade de áreas urbanizáveis, numa cidade que já conta com inúmeros vazios intraurbanos, é, no mínimo, um contrasenso para atingir os ideais da Cidade Compacta tão almejada. Portanto, o discurso apresentado não se realiza.

Perímetro urbano de Jundiaí, em verde, com grandes vazios urbanos demonstrando a falta de necessidade de expandir o perímetro urbano.

A cada mudança de Plano Diretor áreas propícias à especulação imobiliária são criadas, gerando insegurança jurídica, pressão nas zonas ambientalmente frágeis, pressão para ocupação da zona rural e o enorme ônus da infraestrutura em zonas não preparadas para serem urbanizadas. Ajustes são sempre necessários para adequar a legislação vigente à realidade da cidade. O que deve ser evitado a todo custo é que as modificações propostas acabem por favorecer poucos em detrimentos de muitos, que em nome de propostas simplistas a complexidade da vida de toda a população seja comprometida ou, pior ainda, que as futuras gerações arquem com as consequências das escolhas que estamos tomando neste momento.

Assegurar a produção de água de Jundiaí, proteger o cinturão verde (formado tanto pelas Serras do Japi e dos Cristais quanto por nossa Zona Rural) que promove o nosso bem estar, resguardar nossa memória, nosso patrimônio material e imaterial (forjado a ferro pelas ferrovias, a suor por nossos produtores rurais e por nossos operários), valorizar nossa população e sua cultura, promovendo novas formas de trabalho, lazer e de construção do nosso território, deve estar à frente de qualquer proposta de alteração em nosso planejamento. Fórmulas aplicadas constantemente em nossa história, como a da constante expansão do perímetro urbano sobre a Zona Rural, não foram capazes de dar respostas satisfatórias aos problemas territoriais de Jundiaí, criando uma cidade cada vez mais cara e espraiada.

O momento é o de valorização e fortalecimento daquilo que já existe, de nossos maiores ativos, nossa terra e nossa gente, ao invés de continuarmos apostando na falsa ideia de que a comercialização da vida é nossa única saída para o desenvolvimento.

Daniel Motta
Daniel Motta é doutorando em urbanismo na Unicamp, pós-graduado em Economia Criativa e Cidades Criativas pela FGV, mestre em Performance pela Universidad de Alicante na Espanha, mestre em Musicologia pela Unesp e bacharel em Música pela FAAM.

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